Texto 1
Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do sol em vão se atreve;
Papoila ou rosa delicada e fina
Te cobre as faces que são cor da neve.
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamo vapora.
Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para glória de Amor igual Tesouro.
Graças, Marília bela,
Graças à minha estrela!
Gonzaga, T. Antônio. Marília de Dirceu e Cartas Chilenas. São Paulo: Ática,1997, p.12
Texto 2
Saudosamente sentido na ausência da dama a quem o autor muito amava
Entre (ó Floralva) assombros repetidos
É tal a pena, com que vivo ausente,
Que palavra a voz me não consente,
E só para sentir me dá sentidos.
Nos prantos, e nos ais enternecidos,
Dizer não pode o peito o mal que sente;
Pois vai confusa a queixa na corrente,
E mal articulada nos gemidos.
Se para o meu tormento conheceres
Não bastar o sutil discurso vosso,
A dor me não permite outros poderes.
Vede nos prantos, e ais o meu destroço;
E entendei vós o mal como quiserdes,
Que eu só sei explicá-lo como posso.
MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos. São Paulo: Cultrix, 2004, p.202.
A partir dos dois poemas, assinale a alternativa correta.
“Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeumas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: - Não, perdão, meu senhor; meu senhor, perdão! - Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova.
- Toma, diabo! - dizia ele; toma mais perdão, bêbado!
- Meu senhor! - gemia o outro.
- Cala a boca, besta! - replicava o vergalho.
Parei, olhei...
Justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio - o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a bênção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele.
- É, sim, nhonhô.
- Fez-te alguma coisa?
- É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.
- Está bom, perdoa-lhe – disse eu.
- Pois, não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!”
ASSIS, Machado. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: FTD, 1991, p. 111.
A partir do fragmento e da obra Memórias póstumas de Brás Cubas, avalie as assertivas a seguir.
I - Esse trecho exemplifica o comportamento agressivo de homens que eram escravos de grandes senhores, conforme o espírito de romances naturalistas no qual essa obra está inserida.
II - Prudêncio ostenta como proprietário (senhor) de um escravo. Entretanto, ao obedecer à ordem de Brás Cubas, seu antigo carrasco, Prudêncio retorna à condição de submisso da qual não havia saído. Ele demonstra não ter sido preparado para assumir o novo regime de vida com liberdade.
III - Ao espancar o escravo com violenta tirania, após ter sido alforriado, Prudêncio repete em outro preto o mesmo sofrimento pelo qual ele passara, antes de liberto, e seu comportamento revela ser o reflexo do sistema escravocrata praticado no Brasil.
É correto o que se afirma em
“No dia seguinte, Fabiano voltou à cidade, mas ao fechar o negócio notou que as operações de Sinhá Vitória, como de costume, diferiam das do patrão. Reclamou e obteve a explicação habitual: a diferença era proveniente de juros.
Não se conformou: devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel do branco. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, achou bom que o vaqueiro fosse procurar serviço noutra fazenda.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preciso barulho não. Se havia dito palavra à-toa, pedia desculpa. Era bruto, não fora ensinado. Atrevimento não tinha, conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar questão com gente rica? Bruto, sim senhor, mas sabia respeitar os homens. Devia ser ignorância da mulher, provavelmente devia ser ignorância da mulher. Até estranhara as contas dela. Enfim, como não sabia ler (um bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
O amo abrandou, e Fabiano saiu de costas, o chapéu varrendo o tijolo. Na porta, virando-se, enganchou as rosetas das esporas, afastou-se tropeçando os sapatões de couro cru batendo no chão como cascos.”
RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. São Paulo: Record,2019, p.93/94.
A partir do excerto e do livro Vidas Secas, assinale as alternativas verdadeiras (V) e falsas (F).
I - ( ) Mesmo tendo consciência de que o patrão o explorava, Fabiano evitava atrito, pois pretendia permanecer na fazenda onde vivera desde a infância.
II - ( ) Em afirmações como “Passar a vida inteira assim no toco” e “Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!”, Fabiano revela a estratificação da sociedade brasileira que impede e/ou reduz a falta de mobilidade social e econômica dos pobres.
III - ( ) Após conversar com o patrão, Fabiano se convenceu de que Sinhá Vitória havia se equivocado nas contas, pois era analfabeta como ele.
IV - ( ) Os trechos em que Fabiano afirma que era “um cabra”; repete que era um “bruto, sim senhor” e “afastou-se tropeçando os sapatões de couro cru batendo no chão como cascos”, evidenciam o caráter de zoomorfização pelo qual o personagem passa.
V - ( ) Essa fora a primeira vez que as contas de Sinhá Vitória e as do patrão se divergiam, por isso Fabiano ficou descontrolado e indignado.
Está correta a alternativa que apresenta a sequência correta, marcada de cima para baixo.
Fragmento 1:
“Por que escrevo? Antes de tudo porque captei o espírito da língua e assim às vezes a forma é que faz conteúdo. Escrevo portanto não por causa da nordestina mas por motivo grave de ‘força maior’, como se diz nos requerimentos oficiais, por ‘força de lei’.
E eis que fiquei receoso quando pus palavras sobre a nordestina. E a pergunta é: como escrevo? Verifico que escrevo de ouvido assim como aprendi inglês e francês de ouvido. Antecedentes meus do escrever? Sou um homem que tem mais dinheiro que os que passam fome, o que faz de mim de algum modo desonesto. E só minto na hora exata da mentira. Mas quando escrevo não minto. Que mais? Sim, não tenho classe social, marginalizado que sou. A classe alta me tem como um monstro esquisito, a média com desconfiança de que eu possa desequilibrá-la, a classe baixa nunca vem a mim. Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados. Ah que medo de começar e ainda nem sequer sei o nome da moça. Sem falar que a história me desespera por ser simples demais.”
LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco,1998, p.18/19.
Fragmento 2:
“Todas as madrugadas ligava o rádio emprestado por uma colega de moradia, Maria da Penha, ligava bem baixinho para não acordar as outras, ligava invariavelmente para a Rádio Relógio, que dava ’hora certa e cultura’, e nenhuma música, só pingava em som gotas que caem – cada gota de minuto que passava. E sobretudo esse canal de rádio aproveitava intervalos entre as tais gotas de minuto para dar anúncios comerciais – ela adorava anúncios. Era rádio perfeita pois também entre os pingos do tempo dava curtos ensinamentos dos quais talvez algum dia viesse a precisar saber. Foi assim que aprendeu que o Imperador Carlos Magno era na terra dele chamado Carolus.”
LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco,1998, p.37.
Fragmento 3:
“Diante da cara um pouco inexpressiva demais de Macabéa, ele até que quis lhe dizer alguma gentileza suavizante na hora do adeus para sempre. E ao se despedir lhe disse: – Você, Macabéa, é um cabelo na sopa. Não dá vontade de comer. Me desculpe se eu lhe ofendi, mas sou sincero. Você está ofendida? – Não, não, não! Ah por favor quero ir embora! Por favor me diga logo adeus!.”
LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco,1998, p.60.
A partir dos fragmentos e do livro A hora da estrela, de Clarice Lispector, avalie as assertivas a seguir.
I - O romance de Clarice Lispector não é uma obra linear. Os fragmentos exemplificam a voz de Rodrigo S.M., que é o narrador do romance. Na obra, ele faz considerações estético-metalinguísticas, filosóficas e sociais.
II - O fragmento 1, sobretudo no trecho “Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados”, há ênfase no processo de criação da personagem e na tessitura da narrativa.
III - No fragmento 3, o narrador cita a fala do personagem João, no momento em que ele demitiu Macabéa do emprego, uma vez que a moça não conseguia realizar as funções determinadas para ela no trabalho. Ao dizer “você é um cabelo na sopa”, evidencia a insignificância e invisibilidade da nordestina.
IV - Embora Macabéa fosse uma nordestina analfabeta, ao ouvir rádio todas as madrugadas, ela praticamente se tornou uma autodidata e aprendeu muitas informações que a permitiram sobreviver sem a angustiante alienação que tinha antes de migrar para o Rio de Janeiro.
É correto o que se afirma em