Leia o fragmento retirado do livro Amor de perdição, de Camilo Castelo Branco, e responda a questão.
O ferimento de Simão Botelho era melindroso demais para obedecer prontamente ao curativo do ferrador, enfronhado em aforismos de alveitaria. A bala passara-lhe de revés a porção muscular do braço esquerdo; mas algum vaso importante rompera, que não bastavam compressas a vedar-lhe o sangue. Horas depois de ferido, o acadêmico deitou-se febril, deixando-se medicar pelo ferrador. O arreeiro partiu para Coimbra, encarregado de espalhar a notícia de ter ficado no Porto, Simão Botelho.
Mais que as dores e o receio da amputação, o mortificava a ânsia de saber novas de Teresa. João da Cruz estava sempre de sobre-rolda, precavido contra algum procedimento judicial por suspeitas dele. As pessoas que vinham de feirar na cidade contavam todas que dois homens tinham aparecido mortos, e constava serem criados dum fidalgo de Castro d’Aire, ninguém, porém, ouvira imputar o assassínio a determinadas pessoas. Na tarde desse dia recebeu Simão a seguinte carta de Teresa:
"Deus permita que tenhas chegado sem perigo à casa dessa boa gente. Eu não sei o que se passa, mas há coisa misteriosa que eu não posso adivinhar. Meu pai tem estado toda a manhã fechado com o primo, e a mim não me deixa sair do quarto. Mandou-me tirar o tinteiro; mas eu felizmente estava prevenida com outro. Nossa Senhora quis que a pobre viesse pedir esmola debaixo da janela do meu quarto; senão, eu nem tinha modo de lhe dar sinal para ela esperar esta carta. Não sei o que ela me disse. Falou-me em criados mortos; mas eu não pude entender... Tua mana Rita está-me acenando por trás dos vidros do teu quarto...
Disse-me agora tua mana que os moços de meu primo tinham aparecido mortos perto da estrada. Agora já sei tudo. Estive para lhe dizer que tu aí estás, mas não me deram tempo. Meu pai de hora a hora dá passeios no corredor, e solta uns ais muitos altos.
Ó meu querido Simão, que será feito de ti?... Estás ferido? Serei eu a causa da tua morte? Dize-me o que souberes. Eu já não peço a Deus senão a tua vida. Foge desses sítios: vai para Coimbra, e espera que o tempo melhore a nossa situação. Tem confiança nesta desgraçada, que é digna da tua dedicação... Chega a pobre: não quero demorá-la mais... Perguntei-lhe se se dizia de ti alguma coisa, e ela respondeu que não. Deus o queira".
BRANCO, Camilo Castelo. Amor de perdição. 2ª ed. Barueri: Ciranda Cultural, 2017. p. 47-48.
Assinale a alternativa correta sobre Amor de perdição.
Leia o trecho retirado da obra Contos novos, de Mário de Andrade, e responda a questão.
Estou lutando desde o princípio destas explicações sobre a desagregação da nossa amizade, contra uma razão que me pareceu inventada enquanto escrevia, para sutilizar psicologicamente o conto. Mas agora não resisto mais. Está me parecendo que entre as causas mais insabidas, tinha também uma espécie de despeito desprezador de um pelo outro... Se no começo invejei a beleza física, a simpatia, a perfeição espiritual normalíssima de Frederico Paciência, e até agora sinto saudades de tudo isso, é certo que essa inveja abandonou muito cedo qualquer aspiração de ser exatamente igual ao meu amigo. Foi curtíssimo, uns três meses, o tempo em que tentei imitá-lo. Depois desisti, com muito propósito. E não era porque eu conseguisse me reconhecer na impossibilidade completa de imitá-lo, mas porque eu, sinceramente, sabei-me lá por quê! Não desejava mais ser um Frederico Paciência!
ANDRADE, Mário de. Frederico Paciência. In: Contos novos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p. 111-112.
Com base no trecho e na leitura integral do conto “Frederico Paciência”, considere as afirmativas a seguir.
I. O traço modernista no conto acentua-se no trecho porque inexistem maledicências e preconceitos quanto ao relacionamento homossexual entre Juca e Frederico nessa passagem e em outras do conto.
II. A descoberta da homossexualidade de Frederico é o motivo secreto que Juca, no propósito de resguardar o amigo, demora a revelar no trecho, o que também o leva a desmanchar a relação de amizade, já comprometida naquele momento.
III. A ideia de desagregação da amizade entre Frederico e Juca requer explicações porque os laços anteriormente expostos no conto são fortes até mesmo para provocar brigas violentas entre cada um deles e um colega.
IV. O desejo de deixar de imitar Frederico remete a um movimento deliberado de afastar-se da “perfeição espiritual” do amigo, o que está em sintonia com o perfil modernista de caracterização de personagens.
Assinale a alternativa correta
Leia o trecho retirado da obra Contos novos, de Mário de Andrade, e responda a questão.
Estou lutando desde o princípio destas explicações sobre a desagregação da nossa amizade, contra uma razão que me pareceu inventada enquanto escrevia, para sutilizar psicologicamente o conto. Mas agora não resisto mais. Está me parecendo que entre as causas mais insabidas, tinha também uma espécie de despeito desprezador de um pelo outro... Se no começo invejei a beleza física, a simpatia, a perfeição espiritual normalíssima de Frederico Paciência, e até agora sinto saudades de tudo isso, é certo que essa inveja abandonou muito cedo qualquer aspiração de ser exatamente igual ao meu amigo. Foi curtíssimo, uns três meses, o tempo em que tentei imitá-lo. Depois desisti, com muito propósito. E não era porque eu conseguisse me reconhecer na impossibilidade completa de imitá-lo, mas porque eu, sinceramente, sabei-me lá por quê! Não desejava mais ser um Frederico Paciência!
ANDRADE, Mário de. Frederico Paciência. In: Contos novos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p. 111-112.
A morte ronda o conto “Frederico Paciência”, assim como o conto “O peru de Natal”, também incluído em Contos novos.
Assinale a alternativa que apresenta, corretamente, o modo como a morte é abordada nesses contos.
Leia o trecho retirado da obra Contos novos, de Mário de Andrade, e responda a questão.
Estou lutando desde o princípio destas explicações sobre a desagregação da nossa amizade, contra uma razão que me pareceu inventada enquanto escrevia, para sutilizar psicologicamente o conto. Mas agora não resisto mais. Está me parecendo que entre as causas mais insabidas, tinha também uma espécie de despeito desprezador de um pelo outro... Se no começo invejei a beleza física, a simpatia, a perfeição espiritual normalíssima de Frederico Paciência, e até agora sinto saudades de tudo isso, é certo que essa inveja abandonou muito cedo qualquer aspiração de ser exatamente igual ao meu amigo. Foi curtíssimo, uns três meses, o tempo em que tentei imitá-lo. Depois desisti, com muito propósito. E não era porque eu conseguisse me reconhecer na impossibilidade completa de imitá-lo, mas porque eu, sinceramente, sabei-me lá por quê! Não desejava mais ser um Frederico Paciência!
ANDRADE, Mário de. Frederico Paciência. In: Contos novos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p. 111-112.
Sobre as correlações entre o conto “Frederico Paciência”, do volume Contos novos, de Mário de Andrade, e Clara dos Anjos, de Lima Barreto, considere as afirmativas a seguir.
I. O trecho do conto “Frederico Paciência” faz sobressair um ponto de contato com Clara dos Anjos: a desilusão, representada, na narrativa de Lima Barreto, pelo desmascaramento de Cassi Jones, e, no conto de Mário de Andrade, pelas descobertas de deslizes na constituição moral do amigo do narrador-personagem.
II. O trecho do conto “Frederico Paciência” contém confissões da fragilidade de seu narrador-protagonista, que admite suas mentiras e invenções sobre o amigo, assim como Clara dos Anjos, que se descontrola ao se ver ludibriada por Cassi Jones no desfecho da narrativa de Lima Barreto, apesar de tê-lo enganado também.
III. O trecho do conto “Frederico Paciência”, ao aludir à beleza física do amigo, admitida literalmente pelo narrador em primeira pessoa, mantém na narrativa a atração e o contato corporal entre os jovens, materializados no episódio do beijo, e que, em Clara dos Anjos, resultam na gravidez da protagonista.
IV. O trecho do conto “Frederico Paciência” cobre uma relação complexa de amizade entre dois jovens, apresentada pela perspectiva de um dos rapazes, mais livre das vulnerabilidades sentimentais do que Clara dos Anjos na narrativa homônima de Lima Barreto.
Assinale a alternativa correta.
Leia o fragmento retirado do livro Amor de perdição, de Camilo Castelo Branco, e responda a questão.
O ferimento de Simão Botelho era melindroso demais para obedecer prontamente ao curativo do ferrador, enfronhado em aforismos de alveitaria. A bala passara-lhe de revés a porção muscular do braço esquerdo; mas algum vaso importante rompera, que não bastavam compressas a vedar-lhe o sangue. Horas depois de ferido, o acadêmico deitou-se febril, deixando-se medicar pelo ferrador. O arreeiro partiu para Coimbra, encarregado de espalhar a notícia de ter ficado no Porto, Simão Botelho.
Mais que as dores e o receio da amputação, o mortificava a ânsia de saber novas de Teresa. João da Cruz estava sempre de sobre-rolda, precavido contra algum procedimento judicial por suspeitas dele. As pessoas que vinham de feirar na cidade contavam todas que dois homens tinham aparecido mortos, e constava serem criados dum fidalgo de Castro d’Aire, ninguém, porém, ouvira imputar o assassínio a determinadas pessoas. Na tarde desse dia recebeu Simão a seguinte carta de Teresa:
"Deus permita que tenhas chegado sem perigo à casa dessa boa gente. Eu não sei o que se passa, mas há coisa misteriosa que eu não posso adivinhar. Meu pai tem estado toda a manhã fechado com o primo, e a mim não me deixa sair do quarto. Mandou-me tirar o tinteiro; mas eu felizmente estava prevenida com outro. Nossa Senhora quis que a pobre viesse pedir esmola debaixo da janela do meu quarto; senão, eu nem tinha modo de lhe dar sinal para ela esperar esta carta. Não sei o que ela me disse. Falou-me em criados mortos; mas eu não pude entender... Tua mana Rita está-me acenando por trás dos vidros do teu quarto...
Disse-me agora tua mana que os moços de meu primo tinham aparecido mortos perto da estrada. Agora já sei tudo. Estive para lhe dizer que tu aí estás, mas não me deram tempo. Meu pai de hora a hora dá passeios no corredor, e solta uns ais muitos altos.
Ó meu querido Simão, que será feito de ti?... Estás ferido? Serei eu a causa da tua morte? Dize-me o que souberes. Eu já não peço a Deus senão a tua vida. Foge desses sítios: vai para Coimbra, e espera que o tempo melhore a nossa situação. Tem confiança nesta desgraçada, que é digna da tua dedicação... Chega a pobre: não quero demorá-la mais... Perguntei-lhe se se dizia de ti alguma coisa, e ela respondeu que não. Deus o queira".
BRANCO, Camilo Castelo. Amor de perdição. 2ª ed. Barueri: Ciranda Cultural, 2017. p. 47-48.
Em relação à carta incluída no trecho e sua correlação com o romance Amor de perdição, considere as afirmativas a seguir.
I. A carta mostra a incompatibilidade e o desencontro entre os comportamentos morais e afetivos de Teresa e Simão.
II. A carta, recurso frequente nesse romance, apresenta-se como veículo de expressão da subjetividade romântica.
III. A carta dispõe de uma carga melodramática, que pode ser exemplificada com a última frase do penúltimo parágrafo.
IV. A carta é a oportunidade de estabelecer o contato entre os amantes, muitas vezes impedidos de estarem juntos fisicamente.
Assinale a alternativa correta.
Leia o trecho de Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, e responda a questão
15 de maio
Tem noite que eles improvisam uma batucada e não deixa ninguém dormir. Os visinhos de alvenaria já tentaram com abaixo assinado retirar os favelados. Mas não conseguiram. Os visinhos das casas de tijolos diz:
– Os políticos protegem os favelados.
Quem nos protege é o povo e os Vicentinos. Os políticos só aparecem aqui nas epocas eleitoraes. O senhor Cantidio Sampaio quando era vereador em 1953 passava os domingos aqui na favela. Ele era tão agradavel. Tomava nosso café, bebia nas nossas xícaras. Ele nos dirigia as suas frases de viludo. Brincava com nossas crianças. Deixou boas impressões por aqui e quando candidatou-se a deputado venceu. Mas na Camara dos Deputados não criou um projeto para beneficiar o favelado. Não nos visitou mais.
... Eu classifico São Paulo assim: o Palacio, é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.
JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. 10ª ed. São Paulo: Ática, 2014. p.32.
Assinale a alternativa que estabelece a exata correlação entre Quarto de despejo e os romances Casa de pensão, de Aluísio Azevedo, e Clara dos Anjos, de Lima Barreto