A história da medicina é a história de duas marchas
simultâneas; de um lado, o entendimento sobre o
corpo humano e sobre o processo saúde-doença
passou das causalidades exteriores ao homem para os
[5] conhecimentos que localizam no próprio ser humano a
sede dos fenômenos biológicos de que é objeto. De outro
lado, o ser humano, que uma vez foi tido como pertencente
a entidades exteriores ao homem e sobrenaturais, com o
tempo foi considerado como senhor de seu próprio corpo
[10] e possuidor da sua própria autonomia inalienável.
O Código de Ética Médica de 2010 compreende a
saúde e a morte do ser humano como fenômenos ligados
intrinsecamente à condição intensamente humana de
cada paciente, ao mesmo tempo em que reconhece a
[15] centralidade dos conhecimentos científicos para a prática
da medicina que valorize a dignidade do indivíduo. É por
isso que cabe ao médico, por exemplo, aconselhar um
casal em idade fértil sobre as diversas possibilidades de
controle da natalidade; também pelos mesmos motivos
[20] a inseminação artificial dos casais inférteis é motivo de
preocupação dos médicos.
A recente resolução do Conselho Federal de
Medicina, que disciplina o testamento vital – o documento
em que o cidadão pode inscrever os cuidados de saúde
[25] que pretende ou não receber – é a mostra do resultado
dessa conquista, fruto da dupla evolução da medicina;
ela mostra que o cidadão brasileiro, cônscio dos destinos
da sua própria vida, livre de interferências etéreas e
indefiníveis, mas dentro do seio de sua família e a partir
[30] de uma relação médico-paciente estabelecida, pode e
deve decidir dignamente sobre os rumos da sua própria
vida, de modo autônomo e sem qualquer consideração
que o culpe caso decida abreviar sofrimentos. A vida e a
morte do indivíduo não são mais uma determinação de
[35] uma vontade alheia a ele, humana ou sobrenatural.
BISCAIA. Leonardo. O caráter profundamente humano do testamento vital. Disponível em: . Acesso em: 15 set. 2014.
A leitura dos aspectos temáticos do texto está correta em