TEXTO
SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
O objetivo principal do texto é
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SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
Para a comunidade de Calcutá, retratada no texto, "estar no mapa" significa, EXCETO:
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SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
São recursos empregados pela autora em seu texto, EXCETO:
TEXTO
SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
É CORRETO afirmar que o emprego das aspas em "destemidos", tem a função de
TEXTO
SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
Em relação ao gênero, o texto "Seu Google, nós existimos" deve ser classificado como
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SEU GOOGLE, NÓS EXISTIMOS
– Mãe, estou fazendo um mapa da nossa comunidade porque não existe nenhum – disse Sikha, uma menina de 12 anos e olhos muito vivos de uma favela de Calcutá, na Índia.
– Mas tem mapa de todos os lugares, deve ter um daqui também – disse a mãe.
– Não tem – Sikha respondeu.
– Você tem certeza?
– Procuramos no Google e não conseguimos encontrar um mapa da nossa comunidade.
Ao buscar o Google Maps para se enxergar nele, as crianças descobriram que não estavam lá. No lugar onde viviam suas vidas, suas dores, seus sonhos, suas fomes e suas faltas, onde dançavam e choravam, nasciam e morriam, havia só um vazio – um grande nada.
Sua luta para existir – também no mapa – é contada no premiado documentário The revolutionary optimists (Os otimistas revolucionários), de Nicole Newnham e Maren Grainger-Monsen, filmado ao longo de três anos e meio. Com a ajuda do empreendedor social Amlan Ganguly, Sikha e outras crianças desenharam seu mapa. Ao forjar sua inscrição na geografia do mundo, mudaram destinos e salvaram vidas.
O mundo, como Sikha tão bem percebeu, é dividido entre os que estão no mapa – e aqueles que não estão. Não é esquecimento, não é acaso. É violência. Uma violência original – a invisibilidade – que gera todas as outras. Nem os mapas, ou muito menos os mapas, são inocentes. Na Índia, em toda parte.
As crianças das favelas de Calcutá lembraram ao mundo essa violência que atravessa a história – os sem-mapa. A que o Google Maps deu uma atualidade quase hiper-real. Elas descobriram num clique que não estavam lá. Mas como não estavam lá? O que eram suas vidas para aqueles que não as reconheciam lá? Eram invisíveis, então? Por quê? Se no mapa de quem manda no mundo eram vazio, eram um nada, então decidiram mapear-se, contrapor seu olhar ao não olhar que os varria da história. O que outros têm travado no campo da política e até mesmo no campo da guerra, os pequenos favelados enfrentaram com papel e caneta colorida.
As crianças de Calcutá desenharam as ruas, desenharam cada casa, deram a cada uma um número, para que pudessem ser encontradas. “Para ser honesto, às vezes a gente cometia erros e perdia uma casa ou outra”, disse um dos meninos. Conseguiram, então, com o apoio da Universidade Columbia, celulares com GPS. E passaram a fotografar e a localizar casas e pessoas com o auxílio da tecnologia. Colocaram-se no mapa. E, graças a essa façanha, pela primeira vez uma campanha de vacinação contra a poliomielite atingiu 80% de cobertura na comunidade.
As crianças das favelas de Calcutá seguiram em frente. Ao desenhar os contornos da sua geografia, perceberam que era preciso embrenhar-se ainda mais. Tinham de detectar o que devia e o que não devia estar no mapa. Malária, não devia. Diarreia, não devia. Dança, sim. Descobriram que se apropriar do mapa do seu mundo torna possível mudá-lo. E agora, as crianças de Calcutá, os daredevils (“destemidos”), como se autodenominaram, estão no mapa.
Os “destemidos” das favelas de Calcutá não apenas desafiaram o Google e se colocaram no mapa a partir do seu próprio olhar. Também se desenharam sem fronteiras e só por isso nos alcançam aqui, em toda parte, incluindo-nos em seu mapa afetivo. Esses meninos e meninas sem água potável para beber foram capazes de tornar o mundo maior – também para nós.
BRUM, Eliana. Revista Época, 22 de julho de 2013. (Fragmento)
Assinale a alternativa em que o termo em destaque NÃO pode ser substituído pelo termo entre parênteses.