Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuvaainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
O assunto principal do texto se faz explícito em todos os fragmentos transcritos nas alternativas abaixo, EXCETO em:
Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuvaainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
Marque a alternativa que completa CORRETAMENTE o enunciado a seguir:
O título do texto sugere
Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuvaainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
Considerando a estrutura com que foi montado o texto, SÓ NÃO É CORRETO AFIRMAR que
Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuva ainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
O terceiro e o quarto parágrafos do texto apresentam objetos e pessoas das mais diversificadas áreas da cultura e do conhecimento.
Assinale, a seguir, a alternativa em que NÃO se fez uma relação correta entre os pares de palavras e a respectiva área cultural ou da atividade humana indicada nos parênteses.
Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuvaainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
As informações presentes nas alternativas abaixo podem ser confirmadas pelo texto, EXCETO:
Os pássaros, a canção e a pressa
Considerações sobre a indústria da urgência e o caso de um brasileiro que escapou dela
Roberto Pompeu de Toledo
Houve tempo em que quem falava sozinho na rua era considerado louco. Hoje, em nove casos em dez, trata-se do portador de um telefone celular, pessoa considerada normal. Esta observação, como já terá adivinhado o leitor, vem a propósito da morte desse grande brasileiro que foi Antonio Carlos Jobim, mas vamos por partes, começando por um retrospecto do que tem sido a aventura humana neste século.
A aceleração do tempo é uma das características do século XX, talvez a principal delas. As coisas chegam e vão embora com impressionante rapidez. Flâmula – quem se lembra desse objeto? Nos anos 50 e 60, não havia quarto de rapaz que não fosse decorado com flâmulas – espécie de bandeira triangular homenageando clubes ou universidades, cidades ou países. As flâmulas chegaram, fizeram grande sucesso e foram embora. O bambolê teve a mesma sorte.
O século XX viu nascer e morrer o long-playing, o comunismo, o Zeppelin, Che Guevara, a admiração por Che Guevara, John Kennedy, a admiração por John Kennedy, o charleston, o musical de Hollywood, a Iugoslávia, o radinho de pilha, os hippies, os yuppies, o bonde elétrico, o Concorde, as viagens espaciais tripuladas, o surrealismo, o gramofone, a vitrola de alta fidelidade (“hi-fi”), o hidroavião, o concretismo, o disco de 78 rotações e a União Soviética. Algumas invenções pareciam irremediavelmente destinadas à absolescência quando experimentaram um espetacular retorno. Exemplo: camisinha. Outras pareciam destinadas a um espetacular retorno quando experimentaram o fracasso. Exemplo: o Cometa de Halley, que fez enorme sucesso em 1910 e falhou em 1986.
Pode-se alegar que em outros séculos também houve costumes, tecnologias e cometas de vida breve. Não como no século XX, nem em quantidade nem em velocidade. No curto espaço de cinqüenta, sessenta ou setenta anos passou-se do 14-Bis ao Boeing 747, da Maria-fumaça ao Trem-bala,(...) do cinema mudo ao vídeo laser, do lampião de gás ao forno de microondas. Como resultado, a própria velocidade do tempo passou a ser um valor em si. Se as coisas não andam depressa, ficam aborrecidas. Parar é chatear-se, e lá vamos nós: gastança do tempo, a gula de digeri-lo, o consumo compulsivo (...) dessa substância sem cor nem cheiro chamada tempo passou a ser a mais invencível dependência do período, a droga mais mortal. Esta é a hora dos excitados.
Nesse processo, uma das criações mais características do século foi a indústria da urgência. É preciso correr atrás do tempo. Ou correr na frente, melhor ainda. Chegar antes dele, fazer uma hora em menos de uma hora, eis o ideal. Quem não consegue capota, está fora do ritmo, fora de seu tempo, e pronto – com isso chegamos ao telefone celular. Ele é a culminância apoteótica da indústria da urgência que caracteriza estes nossos anos. Contabilize o leitor com rigor científico: quantas vezes deu na vida, ou recebeu, um telefonema realmente urgente? Algo que não pudesse esperar meia hora, até o próximo orelhão? (...)
E no entanto os celulares se multiplicam como saúvas, brotam como capim. Centenas deles, milhares, entram em circulação a cada dia. As pessoas na rua portam o aparelhinho como se fosse uma nova peça do vestuário, ou um novo complemento, como o guarda-chuvaainda que mal comparando, pois o guarda-chuva (...) não toca, não fala nem é histérico como o telefone celular. De repente um monte de gente percebeu que tem pressa, não pode esperar, que é urgente chamar, é urgente ser chamado, é urgente, é urgente, é tudo tão urgente...
Antonio Carlos Jobim não tinha nada a ver com isso, e é por isso que é lembrado nestas linhas. Era um homem de vagares. Gostava de passarinhos, árvores, canções e poesia, quatro produtos fora do alcance da indústria da urgência. Ele andou na contramão da mistificação da pressa que se abateu sobre as vidas da esmagadora maioria de seus contemporâneos. E porque tinha uma outra percepção do tempo conseguiu, mesmo num território do efêmero como da música popular, deixar uma obra que o ultrapassa, em duração.
(Veja, ed.1371, p.150)
Assinale a alternativa em que NÃO se observou no fragmento citado uma tomada de posição crítica do autor diante do assunto principal do texto.