Leia o trecho do romance O Gaúcho, de José de Alencar, para responder à questão.
Como são melancólicas e solenes, ao pino do sol, as vastas campinas que cingem as margens do Uruguai e seus afluentes!
A savana se desfralda a perder de vista, ondulando pelas sangas e coxilhas que figuram as flutuações das vagas nesse verde oceano. Mais profunda parece aqui a solidão, e mais pavorosa, do que na imensidade dos mares.
É o mesmo ermo, porém selado pela imobilidade, e como que estupefato ante a majestade do firmamento.
Raro corta o espaço, cheio de luz, um pássaro erradio, demandando a sombra, longe na restinga de mato que borda as orlas de algum arroio. A trecho passa o poldro bravio, desgarrado do magote; ei-lo que se vai retouçando alegremente babujar a grama do próximo banhado.
No seio das ondas o nauta sente-se isolado; é o átomo envolto numa dobra do infinito. A âmbula imensa tem só duas faces convexas, o mar e o céu. Mas em ambas a cena é vivaz e palpitante. As ondas se agitam em constante flutuação; têm uma voz, murmuram. No firmamento as nuvens cambiam a cada instante ao sopro do vento; há nelas uma fisionomia, um gesto.
A tela oceânica, sempre majestosa e esplêndida, ressumbra possante vitalidade. O mesmo pego, insondável abismo, exubera de força criadora; miríades de animais o povoam, que surgem à flor d’água.
O pampa ao contrário é o pasmo, o torpor da natureza.
O viandante perdido na imensa planície, fica mais que isolado, fica opresso. Em torno dele faz-se o vácuo: súbita paralisia invade o espaço, que pesa sobre o homem como lívida mortalha.
Lavor de jaspe, embutido na lâmina azul do céu, é a nuvem. O chão semelha a vasta lápida musgosa de extenso pavimento. Por toda a parte a imutabilidade. Nem um bafo para que essa natureza palpite; nem um rumor que simule o balbuciar do deserto.
(O Gaúcho, 1999.)
Ao se passar a oração “miríades de animais o povoam” (6° parágrafo) para a voz passiva, sem alteração do sentido original, o verbo assume a forma verbal:
Leia o poema de Mario Quintana para responder à questão.
A carta
Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amare-
[lecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria…
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e
[gáveas…
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!
(Melhores poemas de Mario Quintana, 2003.)
“Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amare-
[lecida,”
Na oração, “dentro de um livro” e “uma velha carta amarelecida” exercem, respectivamente, funções sintáticas de
Leia o texto de Geir Campos para responder à questão.
Desde sempre, em todos os tempos e lugares, teóricos e praticantes têm dito o que pensam da tradução, do que ela é ou do que deveria ser. São opiniões que em muitos casos se contradizem, se desdizem, não só no acessório como no essencial; contradições que enfim não bastam para impedir que os tradutores continuem a fazer o seu trabalho, com a sua prática muitas vezes desmentindo a teoria.
Há quem diga, como o alemão Herder, que o melhor dos tradutores há de ser o melhor dos explicadores; diametralmente oposta é a opinião do americano Vázquez-Ayora, para quem traduzir não é explicar nem comentar coisa alguma. O fato é que, como dizem, não há povo tão isolado que possa dispensar os serviços da tradução. E as traduções afinal estão aí mesmo, pondo em xeque as afirmações de quem diz que tradução é impossível, que tradução não existe, coisas assim...
Pode-se comparar a tradução ao voo do besouro. O besouro é um animal que tem tudo para não poder voar: o corpo é rombudo, as patas não se recolhem, as asas são enfiadas num estojo de cascas duras... mas, apesar de todos os pesares, o besouro voa e muito. Com o tradutor dá-se a mesma coisa: cada texto é um complexo de obstáculos e dificuldades aparentemente intransponíveis, linguísticas e não linguísticas; entender o que o autor disse e o que ele quis dizer, na língua dele, é difícil; dizer na língua da gente o que se entendeu na língua do original, não é fácil... mas o tradutor traduz e muito. E quanto mais difícil parece um texto, maior é o número de tradutores que se candidatam.
(O que é tradução, 2004. Adaptado.)
O voo do besouro, assim como a tradução,
Leia o texto de Roberto DaMatta para responder à questão.
Outro dia fui a um concerto. No local do espetáculo, naqueles momentos que antecedem o som melodioso e afinado das peças musicais, senti mais de perto as emoções que sempre me dominam antes de qualquer drama que vejo ao vivo. Sentimentos de expectativa e de ansiedade me faziam esfregar as mãos e olhar em volta, esses sentimentos que o cinema e, sobretudo, a televisão marginalizaram definitivamente, posto que apresentam imagens de mão única. Cenas que apenas saem das telas em nossa direção, jamais podendo receber de volta nossa reação indignada ou nossos aplausos mais calorosos. Sem a possibilidade de uma reciprocidade curta que eventualmente traz um sentimento inefável de grandeza ou de aborrecimento incontido, o cinema e a TV (cada qual a seu modo, mas numa graduação palpável) suprimiram um dos ingredientes mais importantes do drama (e do rito), que é, precisamente, a possibilidade de dar alguma coisa de volta, diretamente e em cima da hora, aos seus criadores e oficiantes. Isso é o que, a meu ver, constitui a magia do teatro, dos concertos e dos rituais, sendo possivelmente a semente das transformações profundas que tais atos dramáticos podem causar na vida de cada um de nós.
(Explorações, 2011.)
Segundo o autor, o cinema e a televisão são diferentes do concerto e do teatro porque
Leia o texto de Roberto DaMatta para responder à questão.
Outro dia fui a um concerto. No local do espetáculo, naqueles momentos que antecedem o som melodioso e afinado das peças musicais, senti mais de perto as emoções que sempre me dominam antes de qualquer drama que vejo ao vivo. Sentimentos de expectativa e de ansiedade me faziam esfregar as mãos e olhar em volta, esses sentimentos que o cinema e, sobretudo, a televisão marginalizaram definitivamente, posto que apresentam imagens de mão única. Cenas que apenas saem das telas em nossa direção, jamais podendo receber de volta nossa reação indignada ou nossos aplausos mais calorosos. Sem a possibilidade de uma reciprocidade curta que eventualmente traz um sentimento inefável de grandeza ou de aborrecimento incontido, o cinema e a TV (cada qual a seu modo, mas numa graduação palpável) suprimiram um dos ingredientes mais importantes do drama (e do rito), que é, precisamente, a possibilidade de dar alguma coisa de volta, diretamente e em cima da hora, aos seus criadores e oficiantes. Isso é o que, a meu ver, constitui a magia do teatro, dos concertos e dos rituais, sendo possivelmente a semente das transformações profundas que tais atos dramáticos podem causar na vida de cada um de nós.
(Explorações, 2011.)
“sendo possivelmente a semente das transformações profundas que tais atos dramáticos podem causar na vida de cada um de nós.”
Utilizada no trecho em sentido figurado, a palavra sublinhada deve ser entendida como: