Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
Considere o trecho: “Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra: conscientização.” (Linhas 33-36)
Sobre a organização sintática desse trecho, marque a alternativa INCORRETA.
Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
A partir das ideias defendidas pelo articulista, NÃO se pode inferir:
Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
Assinale a alternativa em que claramente o autor se previne em relação a um possível contra-argumento do leitor.
Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
De acordo com o autor, entre os possíveis argumentos usados pelas pessoas para não agirem ou para justificarem suas ações negativas estão, EXCETO
Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
Através dos argumentos do autor, percebem-se alguns sentimentos vivenciados por ele, entre os quais NÃO se encontra:
Texto 1
O futuro que queremos
[1] Primeira história. Desembarquei no aeroporto em um dia particularmente atribulado. Parecia uma convenção
de viajantes costumeiros acrescida dos esporádicos. A fila dos táxis lembrava um dragão chinês de mau humor,
então resolvi, contrariando meus princípios, tomar um táxi “não credenciado” na calçada de cima. Péssima ideia.
Encaminhando-se para a saída do aeroporto, o motorista mal barbeado teve uma atitude de ogro profissional: abriu
[5] sua janela e, com toda a naturalidade, arremessou uma garrafa plástica sobre o jardim.
— O que você fez?! – perguntei, aturdido, como se não soubesse.
— Nada… só joguei fora uma garrafa – respondeu o ogro, que parecia estar ficando verde.
— Como assim? Pare o carro! Volte lá e recolha a garrafa – ordenei, mudando para o verde também.
O que se seguiu foi uma mistura de Deu a louca no mundo com Velozes e furiosos, em que o rapaz não sabia
[10] se me ignorava e seguia ou obedecia ao passageiro ensandecido que, vai ver, era algum tipo de autoridade. Acabou
optando pela segunda, talvez por medo. Quando voltou ao carro, tratei de lhe mostrar o absurdo de sua atitude, falei
sobre o impacto do lixo nos problemas da cidade, de sustentabilidade, da responsabilidade de cada um e assim por
diante. Foi quando ele me interrompeu e me esclareceu seu pensamento:
— Mas doutor, o que adianta eu não fazer se todo mundo faz?
[15] Segunda história. Moro em um “bairro nobre” de São Paulo, para usar a classificação da imprensa. Meus
vizinhos são pessoas de bom nível cultural, com quem mantenho bom relacionamento, sem exceções. Um dia, eu
estava no elevador com um rapaz (quarentão) que mora sozinho, e ambos líamos um comunicado do síndico que
pedia aos condôminos que economizassem água, pois a cidade toda estava enfrentando a possibilidade de
racionamento pela falta de chuvas. Comentei com meu colega da viagem vertical:
[20] — Vou começar a tomar banhos rápidos, apesar de adorar o chuveiro.
— No meu caso – argumentou ele – isso não será necessário, pois moro sozinho, e o impacto de meus
banhos é pequeno. Além disso, se todo o prédio colaborar, não serão meus banhos que irão fazer a diferença.
O que há de comum entre essas duas histórias? O que há é o fato de que as pessoas envolvidas tomaram
suas decisões considerando o comportamento que elas supunham que as outras teriam. O raciocínio do motorista
[25] foi: “não adianta eu não fazer, porque todo mundo vai continuar fazendo”. O do vizinho: “eu não preciso fazer, porque
todo mundo vai fazer”. Embora opostos, esses dois raciocínios são semelhantes, pois ambos justificam sua ação (ou
a falta dela) pelo comportamento do coletivo.
Esse pensamento individual e egoísta tem sua lógica, mas é altamente nocivo por um motivo: se todos
pensarem assim, teremos um comportamento padrão.
[30] Tive a oportunidade rara de participar da Rio+20 como debatedor de um painel sobre o “trabalho verde”, que
discutiu, tanto o surgimento das tarefas específicas voltadas à sustentabilidade, quanto o impacto de qualquer
trabalhador na preservação (ou destruição) do planeta.
Como seria o último debatedor a falar, fui anotando as considerações de todas as pessoas que me
antecederam, entre eles, empresários e especialistas em recursos humanos, todos experientes, bem informados e
[35] engajados. O que mais me chamou a atenção e que orientou a minha fala foi a repetição de uma palavra:
conscientização.
De fato, não há como negar que só temos uma chance de salvar o planeta, e esta passa pela conscientização
das pessoas em geral, em todos os ambientes, pois é a soma das atitudes que poderá promover alguma mudança. E
é aí que surge a grande dúvida: como é que se faz isso exatamente? Como fazer com que cada pessoa, cada um
[40] mesmo, seja transeunte, operário, dona de casa, executivo ou motorista de táxi, cuide de seu pequeno latifúndio e,
principalmente do espaço comum? Como acabar com a maléfica ideia do “faço, mas quem não faz”?
Mas nem tudo está perdido, pois o aumento da consciência sobre a qual se falou no debate é a que deriva de
outra fonte: da educação. Aliás, em minha modesta opinião, é exatamente para isso que serve a educação. Para
aumentar a lucidez, a consciência, a capacidade de análise e de julgamento do jovem. Não, o conhecimento não é o
[45] fim de um processo de educação, é o meio. O fim é o pensamento e, depois dele, o comportamento.
Quando falamos em conscientização, estamos, na prática, falando sobre elevar a condição do humano através
de seu posicionamento como agente do destino, do seu, dos outros e do mundo. Conscientizar não é só abandonar
a ignorância, é mais que isso, é integrar-se na construção do coletivo digno e edificante. Somos sete bilhões e não
paramos de aumentar. Sete bilhões de corpos que têm necessidades e desejos e que esperam que o planeta supra
[50] sem reclamar. O problema é que a ilimitada ambição humana vive em um planetinha de recursos limitados, e essa
conta não fecha.
Meu sonho é viver em um mundo em que o motorista de táxi saiba dirigir, conheça bem a cidade e que
também tenha consciência planetária. É pedir demais? Não acho. O problema é que esse mundo só vai existir
quando cada pessoa que o desejar se der conta de que suas menores ações é que são as grandes responsáveis por
[55] sua construção.
Sei, sei, a saída está na conscientização. Já ouvi isso antes. Então espere um pouco, caro leitor, vou até a
cozinha apagar as luzes. Como as lâmpadas não pensam, precisamos pensar por elas, e há dois jeitos: pela
consciência e pela ciência, ambas resultado da qualidade que nos faz humanos, a inteligência. Só que a inteligência
é como a fissão nuclear e a internet, pode produzir o bem ou o mal, a depender da consciência (de novo…).
[60] Uma saída possível está no relatório da Comissão para a educação do século XXI da UNESCO. Nele há uma
proposta admirável, que pode e deve ser aplicada em todos os ambientes de desenvolvimento humano, e eles são
muitos: as escolas, naturalmente, mas também as empresas, os clubes, os condomínios, os espaços públicos, as
famílias. A proposta é que precisamos ensinar os jovens, não só a aprender a conhecer, que equivale a aumentar o
conhecimento, que é o objeto da educação clássica, mas também a aprender a fazer, aprender a conviver e
[65] aprender a ser. Ou seja, fazer coisas úteis com o conhecimento adquirido, perceber a imensa interdependência entre
os seres humanos e a Natureza e ser alguém que conduz sua vida sem abrir mão dos seus valores.
Disponível em: http://www.eugeniomussak.com.br/o-futuro-que-queremos/. Acesso em: 23 set. 2017. Adaptado.
Texto 02
Receita de Ano Novo
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Receita de Ano Novo. São Paulo: Editora Record, 2008.
Para construir a sua argumentação, o autor lança mão de alguns recursos entre os quais se encontram, EXCETO