TEXTO I
[1] Também é característico do regime
patriarcal o homem fazer da mulher uma
criatura tão diferente dele quanto possível. Ele
o sexo forte, ela o fraco; ele o sexo nobre, ela o
[5] belo.
Mas a beleza que se quer da mulher, dentro
do sistema patriarcal, é uma beleza meio
mórbida. A menina de tipo franzino, quase
doente. Ou então a senhora gorda, mole,
[10] caseira, maternal, coxas e nádegas largas.
Nada do tipo vigoroso e ágil, aproximando-se
da figura do rapaz.
Talvez nos motivos psíquicos da preferência
por aquele tipo de mulher mole e gorda se
[15] encontre mais de uma raiz econômica:
principalmente o desejo, dissimulado, é claro,
de afastar-se a possível competição da mulher
no domínio, econômico e político.
À exploração da mulher pelo homem,
[20] característica de outros tipos de sociedade ou
organização social, mas notadamente do tipo
patriarcal-agrário — tal como o que dominou
longo tempo no Brasil — convém a extrema
especialização ou diferenciação dos sexos. Por
[25] essa diferenciação exagerada, se justifica o
chamado padrão duplo de moralidade, dando
ao homem todas as liberdades de gozo físico do
amor e limitando o da mulher a ir para a cama
com o marido, toda santa noite que ele estiver
[30] disposto a procriar.
O padrão duplo de moralidade característico
do sistema patriarcal limita as oportunidades da
mulher ao serviço e às artes domésticas. E uma
vez por outra, em um tipo de sociedade católica
[35] como a brasileira, ao contato com o confessor.
Aliás, pode-se atribuir ao confessionário, nas
sociedades patriarcais em que se verifique
extrema reclusão ou opressão da mulher,
função utilíssima de higiene mental, ou melhor,
[40] de saneamento mental.
Muita mulher brasileira deve se ter salvado
da loucura, que parece haver sido mais
frequente entre as mulheres das colônias
puritanas da América do que entre nós, graças
[45] ao confessionário.
Gilberto Freyre. Sobrados e mocambos. Cap. IV. pág. 207-208. Texto adaptado.
O primeiro parágrafo do texto (linhas 1-5) é formado de dois períodos. O segundo período, em relação ao primeiro, desempenha mais de uma função discursiva. Dentre essas funções, a única que o segundo período NÃO desempenha é a função de
TEXTO I
[1] Também é característico do regime
patriarcal o homem fazer da mulher uma
criatura tão diferente dele quanto possível. Ele
o sexo forte, ela o fraco; ele o sexo nobre, ela o
[5] belo.
Mas a beleza que se quer da mulher, dentro
do sistema patriarcal, é uma beleza meio
mórbida. A menina de tipo franzino, quase
doente. Ou então a senhora gorda, mole,
[10] caseira, maternal, coxas e nádegas largas.
Nada do tipo vigoroso e ágil, aproximando-se
da figura do rapaz.
Talvez nos motivos psíquicos da preferência
por aquele tipo de mulher mole e gorda se
[15] encontre mais de uma raiz econômica:
principalmente o desejo, dissimulado, é claro,
de afastar-se a possível competição da mulher
no domínio, econômico e político.
À exploração da mulher pelo homem,
[20] característica de outros tipos de sociedade ou
organização social, mas notadamente do tipo
patriarcal-agrário — tal como o que dominou
longo tempo no Brasil — convém a extrema
especialização ou diferenciação dos sexos. Por
[25] essa diferenciação exagerada, se justifica o
chamado padrão duplo de moralidade, dando
ao homem todas as liberdades de gozo físico do
amor e limitando o da mulher a ir para a cama
com o marido, toda santa noite que ele estiver
[30] disposto a procriar.
O padrão duplo de moralidade característico
do sistema patriarcal limita as oportunidades da
mulher ao serviço e às artes domésticas. E uma
vez por outra, em um tipo de sociedade católica
[35] como a brasileira, ao contato com o confessor.
Aliás, pode-se atribuir ao confessionário, nas
sociedades patriarcais em que se verifique
extrema reclusão ou opressão da mulher,
função utilíssima de higiene mental, ou melhor,
[40] de saneamento mental.
Muita mulher brasileira deve se ter salvado
da loucura, que parece haver sido mais
frequente entre as mulheres das colônias
puritanas da América do que entre nós, graças
[45] ao confessionário.
Gilberto Freyre. Sobrados e mocambos. Cap. IV. pág. 207-208. Texto adaptado.
Este texto inicia o quarto capítulo do livro de Gilberto Freire, Sobrados e mocambos. O capítulo começa com a partícula “também”, o que sugere que há, entre o que vai ser dito e o que foi dito, uma ideia de
TEXTO I
[1] Também é característico do regime
patriarcal o homem fazer da mulher uma
criatura tão diferente dele quanto possível. Ele
o sexo forte, ela o fraco; ele o sexo nobre, ela o
[5] belo.
Mas a beleza que se quer da mulher, dentro
do sistema patriarcal, é uma beleza meio
mórbida. A menina de tipo franzino, quase
doente. Ou então a senhora gorda, mole,
[10] caseira, maternal, coxas e nádegas largas.
Nada do tipo vigoroso e ágil, aproximando-se
da figura do rapaz.
Talvez nos motivos psíquicos da preferência
por aquele tipo de mulher mole e gorda se
[15] encontre mais de uma raiz econômica:
principalmente o desejo, dissimulado, é claro,
de afastar-se a possível competição da mulher
no domínio, econômico e político.
À exploração da mulher pelo homem,
[20] característica de outros tipos de sociedade ou
organização social, mas notadamente do tipo
patriarcal-agrário — tal como o que dominou
longo tempo no Brasil — convém a extrema
especialização ou diferenciação dos sexos. Por
[25] essa diferenciação exagerada, se justifica o
chamado padrão duplo de moralidade, dando
ao homem todas as liberdades de gozo físico do
amor e limitando o da mulher a ir para a cama
com o marido, toda santa noite que ele estiver
[30] disposto a procriar.
O padrão duplo de moralidade característico
do sistema patriarcal limita as oportunidades da
mulher ao serviço e às artes domésticas. E uma
vez por outra, em um tipo de sociedade católica
[35] como a brasileira, ao contato com o confessor.
Aliás, pode-se atribuir ao confessionário, nas
sociedades patriarcais em que se verifique
extrema reclusão ou opressão da mulher,
função utilíssima de higiene mental, ou melhor,
[40] de saneamento mental.
Muita mulher brasileira deve se ter salvado
da loucura, que parece haver sido mais
frequente entre as mulheres das colônias
puritanas da América do que entre nós, graças
[45] ao confessionário.
Gilberto Freyre. Sobrados e mocambos. Cap. IV. pág. 207-208. Texto adaptado.
O início do segundo parágrafo com um “mas” (linha 6) indica uma oposição
TEXTO I
[1] Também é característico do regime
patriarcal o homem fazer da mulher uma
criatura tão diferente dele quanto possível. Ele
o sexo forte, ela o fraco; ele o sexo nobre, ela o
[5] belo.
Mas a beleza que se quer da mulher, dentro
do sistema patriarcal, é uma beleza meio
mórbida. A menina de tipo franzino, quase
doente. Ou então a senhora gorda, mole,
[10] caseira, maternal, coxas e nádegas largas.
Nada do tipo vigoroso e ágil, aproximando-se
da figura do rapaz.
Talvez nos motivos psíquicos da preferência
por aquele tipo de mulher mole e gorda se
[15] encontre mais de uma raiz econômica:
principalmente o desejo, dissimulado, é claro,
de afastar-se a possível competição da mulher
no domínio, econômico e político.
À exploração da mulher pelo homem,
[20] característica de outros tipos de sociedade ou
organização social, mas notadamente do tipo
patriarcal-agrário — tal como o que dominou
longo tempo no Brasil — convém a extrema
especialização ou diferenciação dos sexos. Por
[25] essa diferenciação exagerada, se justifica o
chamado padrão duplo de moralidade, dando
ao homem todas as liberdades de gozo físico do
amor e limitando o da mulher a ir para a cama
com o marido, toda santa noite que ele estiver
[30] disposto a procriar.
O padrão duplo de moralidade característico
do sistema patriarcal limita as oportunidades da
mulher ao serviço e às artes domésticas. E uma
vez por outra, em um tipo de sociedade católica
[35] como a brasileira, ao contato com o confessor.
Aliás, pode-se atribuir ao confessionário, nas
sociedades patriarcais em que se verifique
extrema reclusão ou opressão da mulher,
função utilíssima de higiene mental, ou melhor,
[40] de saneamento mental.
Muita mulher brasileira deve se ter salvado
da loucura, que parece haver sido mais
frequente entre as mulheres das colônias
puritanas da América do que entre nós, graças
[45] ao confessionário.
Gilberto Freyre. Sobrados e mocambos. Cap. IV. pág. 207-208. Texto adaptado.
Sobre o período — “À exploração da mulher pelo homem, característica de outros tipos de sociedade ou organização social, mas notadamente do tipo patriarcal-agrário — tal como o que dominou longo tempo no Brasil — convém a extrema especialização ou diferenciação dos sexos” (linhas 19-24) só NÃO se pode dizer que
A bagaceira, obra de José Américo de Almeida, publicada em 1928, é a precursora do moderno romance brasileiro do Nordeste.
O romance passa-se entre 1898 e 1915, dois períodos de seca. Valentim Pereira, sua filha Soledade e o afilhado Pirunga abandonam a fazenda do Bondó, na zona do sertão. Encaminham-se para as regiões dos engenhos, no brejo, onde encontram acolhida no engenho Marzagão, de propriedade de Dagoberto Marçau, cuja mulher, uma retirante, falecera por ocasião do nascimento do único filho, Lúcio. Passando as férias no engenho, Lúcio conhece Soledade e por ela se apaixona.
A história vai muito além, mas essas informações são suficientes para o entendimento do texto desta prova, extraído do primeiro capítulo.
TEXTO II
A mata fronteira, o padrão majestoso,
estava acesa numa cor de incêndio.
Havia uma semana, surdira um toque
estranho na monotonia da verdura. Dir-se-ia
[50] um ramo amarelido à torreira da estação.
Dominava ainda a esmeralda tropical. Mas,
com pouco, emergira o mesmo matiz em
outro trecho vizinho, como um efeito de luz,
um beijo fulgurante do sol em árvore favorita.
[55] E, logo, o pau d’arco assoberbou a flora, como
um banho de ouro na folhagem.
Nessa manhã luminosa a mata
resplandecia com uma orgia de desabrocho
em sua pompa auriverde.
[60] Sem a percepção da paisagem, com a
sensibilidade obtusa e entorpecida aos
primores da natureza, Dagoberto inquietava-
se, pela primeira vez, perante o ouro que
frondejava. Parecia-lhe que o sol tinha
[65] baixado sobre a selva fulva.
Era, talvez, a cor que lhe suscitara o
interesse chambão. As pétalas áureas...
E semicerrou, novamente, os olhos
descuriosos.
[70] Senão quando, foi despertado por uma voz
sumida que o sobressaltou. Não notara o
acesso de outro grupo de retirantes.
Importunavam-no os intrusos, cortando-
lhe o fio dos cálculos da colheita ou de alguma
[75] cisma transitória.
Pediam-lhe uma pousada.
Ele abanou a cabeça negativamente.
E os ádvenas quedaram-se esmorecidos
pelo repouso momentâneo.
[80] Saiu para enxotá-los [...]
E esbravejou:
— O que já disse está dito!!
Nisto, desmontou-se uma rapariga e, com
a vozita soprara:
[85] — Se o senhor pudesse mandar alcançar-
me um pouco d’água...
Ele examinou-a através das pestanas
cerdosas e ficou com a fisionomia suspensa,
como quem reconstitui uma visão ou evoca
[90] um fato.
— Milonga, olha aqui!
E, enquanto a retirante segurava o copo
com os dedos mirrados, interpelou, indicando
um rapaz que a acompanhava:
[95] — São irmãos?
— Senhor não; mas, é como se fosse —
respondeu o mais velho que procurava
esconder a cara na barba intonsa.
Seguiram caminho.
[100] — Manuel Broca! Ma-nuel!
Chegou o feitor. E Dagoberto, apontando o
grupo que se distanciava:
— Arranche aquela gente.
E entrou a ir e vir, em longos passos
[105] frouxos, no seu hábito de marchar para um
ponto que lhe estava mais na imaginação do
que no espaço.
José Américo de Almeida. A Bagaceira. pág. 7-9.
Atente para o que se diz sobre o vocábulo “ainda” em “Dominava ainda a esmeralda tropical” (linha 51).
I. Indica um passado recente — tempo predominante na narrativa.
II. Aponta para um tempo indicado pela expressão ”havia uma semana” (linha 48).
III. É reiterado pela expressão “nessa manhã luminosa” (linha 57).
Está correto o que se diz somente em
A bagaceira, obra de José Américo de Almeida, publicada em 1928, é a precursora do moderno romance brasileiro do Nordeste.
O romance passa-se entre 1898 e 1915, dois períodos de seca. Valentim Pereira, sua filha Soledade e o afilhado Pirunga abandonam a fazenda do Bondó, na zona do sertão. Encaminham-se para as regiões dos engenhos, no brejo, onde encontram acolhida no engenho Marzagão, de propriedade de Dagoberto Marçau, cuja mulher, uma retirante, falecera por ocasião do nascimento do único filho, Lúcio. Passando as férias no engenho, Lúcio conhece Soledade e por ela se apaixona.
A história vai muito além, mas essas informações são suficientes para o entendimento do texto desta prova, extraído do primeiro capítulo.
TEXTO II
A mata fronteira, o padrão majestoso,
estava acesa numa cor de incêndio.
Havia uma semana, surdira um toque
estranho na monotonia da verdura. Dir-se-ia
[50] um ramo amarelido à torreira da estação.
Dominava ainda a esmeralda tropical. Mas,
com pouco, emergira o mesmo matiz em
outro trecho vizinho, como um efeito de luz,
um beijo fulgurante do sol em árvore favorita.
[55] E, logo, o pau d’arco assoberbou a flora, como
um banho de ouro na folhagem.
Nessa manhã luminosa a mata
resplandecia com uma orgia de desabrocho
em sua pompa auriverde.
[60] Sem a percepção da paisagem, com a
sensibilidade obtusa e entorpecida aos
primores da natureza, Dagoberto inquietava-
se, pela primeira vez, perante o ouro que
frondejava. Parecia-lhe que o sol tinha
[65] baixado sobre a selva fulva.
Era, talvez, a cor que lhe suscitara o
interesse chambão. As pétalas áureas...
E semicerrou, novamente, os olhos
descuriosos.
[70] Senão quando, foi despertado por uma voz
sumida que o sobressaltou. Não notara o
acesso de outro grupo de retirantes.
Importunavam-no os intrusos, cortando-
lhe o fio dos cálculos da colheita ou de alguma
[75] cisma transitória.
Pediam-lhe uma pousada.
Ele abanou a cabeça negativamente.
E os ádvenas quedaram-se esmorecidos
pelo repouso momentâneo.
[80] Saiu para enxotá-los [...]
E esbravejou:
— O que já disse está dito!!
Nisto, desmontou-se uma rapariga e, com
a vozita soprara:
[85] — Se o senhor pudesse mandar alcançar-
me um pouco d’água...
Ele examinou-a através das pestanas
cerdosas e ficou com a fisionomia suspensa,
como quem reconstitui uma visão ou evoca
[90] um fato.
— Milonga, olha aqui!
E, enquanto a retirante segurava o copo
com os dedos mirrados, interpelou, indicando
um rapaz que a acompanhava:
[95] — São irmãos?
— Senhor não; mas, é como se fosse —
respondeu o mais velho que procurava
esconder a cara na barba intonsa.
Seguiram caminho.
[100] — Manuel Broca! Ma-nuel!
Chegou o feitor. E Dagoberto, apontando o
grupo que se distanciava:
— Arranche aquela gente.
E entrou a ir e vir, em longos passos
[105] frouxos, no seu hábito de marchar para um
ponto que lhe estava mais na imaginação do
que no espaço.
José Américo de Almeida. A Bagaceira. pág. 7-9.
Atente ao enunciado “Dominava ainda a esmeralda tropical” (linha 51).
I. O enunciado é formado por uma metáfora em que só aparece o segundo termo da comparação ou o termo comparante. O termo comparado é inferido do texto.
II. Na metáfora em foco foram aproveitados dois dos traços semânticos que ajudam a compor o significado da palavra esmeralda: a cor e o valor, comuns ao termo comparado e ao termo comparante.
III. Ao construir uma metáfora o falante seleciona somente os traços semânticos comuns ao termo comparante e ao termo comparado que interessam ao propósito do texto.
Está correto o que se diz em