COMERCIANTE
(a seus dois acompanhantes, ao guia e ao cule que vai levando as bagagens) Depressa, seus moleirões! Precisamos chegar ao posto de Han dentro de dois dias, pois temos de levar um dia de vantagem, custe o que custar.
(ao público) Eu sou o comerciante Karl Langmann, e vou de viagem para a cidade de Urga, onde espero fechar o negócio de uma concessão. Meus concorrentes vêm aí, atrás de mim. O negócio é de quem chegar primeiro. Graças à minha esperteza, e à minha disposição para vencer quaisquer dificuldades, e à dureza com que sempre tratei todo o meu pessoal, até aqui a viagem foi feita quase que na metade do tempo que costuma levar. Por azar, meus concorrentes parecem ter alcançado também uma rapidez igual.
(olha para trás, com o binóculo) Lá vêm eles de novo, vejam só: sempre nos meus calcanhares!
(ao guia) Por que não dá em cima desse cule? Foi para isso que contratei você! Mas, pelo visto, o que querem fazer é turismo às minhas custas. Vocês nem podem fazer ideia de quanto custa uma viagem destas: porque o dinheiro não é de vocês! Se vai continuar me sabotando, eu faço queixa de você na Agência, assim que chegarmos em Urga!
GUIA
(ao cule) Veja se pode apertar mais o passo!
COMERCIANTE
Sua garganta não dá o tom certo: nunca há de ser um guia de verdade. Eu devia ter chamado um mais caro. Os outros estão cada vez mais perto. Bata nesse rapaz, para ele andar! Vamos, o que está esperando? Eu não sou favorável à pancada, mas há umas horas em que só batendo! Se eu não chego primeiro, estou falido! Para o transporte da minha bagagem, você foi chamar logo o seu irmão. Foi ou não foi? Confesse! Não bate nele porque é seu parente. Eu sei muito bem como vocês são: não é que lhes falte brutalidade. Ou você bate nele, ou está despedido! Depois pode ir queixar-se na Justiça, por causa do salário. Meu Deus do céu, eles estão nos alcançando!
Bertold Brecht. A exceção e a regra.
Considerando o trecho precedente, da peça A exceção e a regra, de Bertold Brecht, julgue o item subsequente.
A peça revela a exploração nas relações trabalhistas, por meio de abusos de poder e da opressão pelo medo.