A questão refere-se ao texto “Dizer o que se pensa não é sempre uma qualidade”
Dizer o que se pensa não é sempre uma qualidade
Suzana Herculano-Houzel
Donald Trump fala o que muitos pensam e não têm coragem de dizer, segundo seus eleitores.
Cheguei aos EUA em 2016 com Obama na Casa Branca e assisti boquiaberta, poucos meses depois, a uma parcela significativa
da nação eleger uma figura no mínimo controversa. Trump parecia imune aos próprios atentados contra os valores americanos. A
razão, louvada por tantos de seus eleitores? “Ele fala o que muitos pensam e não têm coragem de dizer.”
[05] E ainda faz escola. Já ouvi o mesmo argumento de vários que apoiam presidenciáveis brasileiros. Como se dizer o que se pensa
fosse, de fato, sempre algo louvável. Mas não é.
Pensar besteira todo mundo faz, de chegar na mureta do mirante e ponderar que “é só passar a perna por cima e me jogar” ou olhar
para o vizinho e pensar que “se eu o empurrasse, ele teria morte certa”. Evocar associações comuns, como mureta e suicídio, é apenas
natural para o cérebro, consequência inevitável do seu aprendizado por repetição.
[10] Da mesma forma, num ambiente em que racismo, homofobia e liberdades tomadas com a vida dos outros ainda imperam, onde se
cresce ouvindo que negros e índios são isso, gays são aquilo, e onde todo útero grávido é propriedade coletiva, insultar é o impulso
mental fácil, mesmo que por repetição, e não por crença.
Pensamentos também são testes de ações mentais e suas consequências possíveis. Mentalmente, todo mundo um dia xinga a mãe,
esbofeteia o vizinho, esfaqueia o marido ou profere insultos racistas e homofóbicos.
[15] Mas a grande maioria para no pensamento, horrorizada pela consequência que suas ações mentais teriam na vida real se executadas
ou ditas. Pensamentos terríveis têm essa utilidade: primatas que somos, com um córtex pré-frontal expressivo, capaz de reconhecer
más ideias e impedi-las de vir à tona, não precisamos chegar às vias de fato para aprender a não fazer besteira.
Dizer o que “todo mundo pensa mas não ousa dizer”, portanto, não é sinal de coragem, nem de honestidade, mas apenas de falta de controle pré-frontal – ou de mau caráter mesmo.
(Herculano-Houzel, Suzana [bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA)]. Dizer o que se pensa não é sempre uma qualidade. Folha de São Paulo, 14/08/2010. Adaptado. Disponível em: http://www.brasilagro.com.br/conteudo/dizer-o-que-se-pensa-nao-e-sempre-uma-qualidade.html. Acesso em 11 ago. 2018)
Com relação a aspectos semântico-sintáticos do texto e aos operadores argumentativos nele presentes, é correto afirmar que