Questões de Português - Gramática - Semântica - Paráfrase
Leia o excerto de Milton Santos para responder à questão.
Após a Segunda Guerra Mundial, tem início o período técnico-científico, devido à profunda interação da ciência e da técnica. A união entre a técnica e a ciência vai dar-se sob a égide* do mercado que, graças à ciência e à técnica, torna-se um mercado global. A ideia da ciência, a ideia de tecnologia e a ideia de mercado global devem ser encaradas conjuntamente. Além disso, as mudanças que ocorrem na natureza também se subordinam a essa lógica.
Nesse período, os objetos técnicos tendem a ser ao mesmo tempo técnicos e informacionais, já que, graças à extrema intencionalidade de sua produção e de sua localização, eles já surgem como informação e, na verdade, a energia principal de seu funcionamento é também a informação. Estamos diante de algo novo, a que estamos chamando de meio técnico-científicoinformacional.
SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo, SP. EDUSP, 2002. Adaptado.
*Égide (s.f.): escudo; por derivação, o que protege, ampara.
Parafrasear é reescrever um texto utilizando uma linguagem diferente, mas mantendo seu sentido original.
Assinale a alternativa que apresenta a paráfrase correta da passagem destacada no texto.
Texto
Da solidão
Há muitas pessoas que sofrem do mal da solidão.
Basta que em redor delas se arme o silêncio, que não se
manifeste aos seus olhos nenhuma presença humana, para
que delas se apodere imensa angústia: como se o peso do
[5] céu desabasse sobre sua cabeça, como se dos horizontes
se levantasse o anúncio do fim do mundo.
No entanto, haverá na terra verdadeira solidão?
Não estamos todos cercados por inúmeros objetos, por
infinitas formas da Natureza e o nosso mundo particular
[10] não está cheio de lembranças, de sonhos, de raciocínios,
de ideias, que impedem uma total solidão?
Tudo é vivo e tudo fala, em redor de nós, embora
com vida e voz que não são humanas, mas que podemos
aprender a escutar, porque muitas vezes essa linguagem
[15] secreta ajuda a esclarecer o nosso próprio mistério. Como
aquele Sultão Mamude, que entendia a fala dos pássaros,
podemos aplicar toda a nossa sensibilidade a esse
aparente vazio de solidão: e pouco a pouco nos sentiremos
enriquecidos.
[20] Pintores e fotógrafos andam em volta dos objetos
à procura de ângulos, jogos de luz, eloquência de formas,
para revelarem aquilo que lhes parece não só o mais
estático dos seus aspectos, mas também o mais
comunicável, o mais rico de sugestões, o mais capaz de
[25] transmitir aquilo que excede os limites físicos desses
objetos, constituindo, de certo modo, seu espírito e sua
alma.
Façamo-nos também desse modo videntes:
olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das
[30] cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos
tecidos sem maiores pretensões. Não procuremos neles a
beleza que arrebata logo o olhar, o equilíbrio de linhas, a
graça das proporções: muitas vezes seu aspecto – como o
das criaturas humanas – é inábil e desajeitado. Mas não é
[35] isso que procuramos, apenas: é o seu sentido íntimo que
tentamos discernir. Amemos nessas humildes coisas a
carga de experiências que representam, e a repercussão,
nelas sensível, de tanto trabalho humano, por infindáveis
séculos.
[40] Amemos o que sentimos de nós mesmos, nessas
variadas coisas, já que, por egoístas que somos, não
sabemos amar senão aquilo em que nos encontramos.
Amemos o antigo encantamento dos nossos olhos infantis,
quando começavam a descobrir o mundo: as nervuras das
[45] madeiras, com seus caminhos de bosques e ondas e
horizontes; o desenho dos azulejos; o esmalte das louças;
os tranquilos, metódicos telhados... Amemos o rumor da
água que corre, os sons das máquinas, a inquieta voz dos
animais, que desejaríamos traduzir.
[50] Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever
de amor aplicarmos o ouvido, a vista, o coração a essa
infinidade de formas naturais ou artificiais que encerram
seu segredo, suas memórias, suas silenciosas experiências.
A rosa que se despede de si mesma, o espelho onde pousa
[55] o nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos
de quem dorme, tudo, tudo é um mundo com passado,
presente, futuro, pelo qual transitamos atentos ou
distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com
violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso
[60] respeito; que espera que o descubramos, sem anunciar
nem pretender prevalecer; que pode ficar para sempre
ignorado, sem que por isso deixe de existir; que não faz da
sua presença um anúncio exigente " Estou aqui! estou
aqui! ". Mas, concentrado em sua essência, só se revela
[65] quando os nossos sentidos estão aptos para descobrirem.
E que em silêncio nos oferece sua múltipla companhia,
generosa e invisível.
Oh! se vos queixais de solidão humana, prestai
atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a
[70] essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que
conversará convosco interminavelmente.
MEIRELES, Cecília. Da solidão. In: MEIRELES, Cecília. Janela Mágica. São Paulo: Global, 2016, pp. 71-74.
A expressão destacada no trecho “Façamo-nos também desse modo videntes: olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos tecidos sem maiores pretensões.” (linhas 28-31) pode ser substituída sem mudança de sentido por
A frase que melhor expressa a essência dessa mensagem é a transcrita em
Texto
No toque do tempo
Batida do tambor
marcando o tempo
Sentir os acontecimentos
[125] entre a batida e
outra, um meio tempo
preparando um outro tempo.
tempo de deixar no ponto
corpo pro Santo descer
[130] para luz acender amparar
com cuidado a criança,
que vai nascer.
tempo que assenta sentimentos
fazendo a gente sentir que sente.
[135] sentindo a sinergia da barca
lotada que vai e vem
atravessando a baía.
tempo da cigarra prever o tempo
e morrer.
[140] Tempo do artista encontrar
suas suaves cores vivas.
Tempo pro Ser compreender
Suas emoções,
Se alforriar
[145] E cessar.
CRUZ, Ana. No Toque do tempo. In: Com perdão da palavra, p. 69.
No verso “tempo da cigarra prever o tempo e morrer” (linhas 138-139), o poema faz referência à fábula A Cigarra e a Formiga, de Esopo.
Esse recurso que utiliza, no processo de composição textual, referência a um texto pré-existente é denominado de
A questão refere-se ao texto.
Não existe indústria da multa
O que queremos é um atalho para tornar a nossa vida melhor e que se danem os outros
Houzel Rodrigo Zeidan
Não existe indústria da multa. Para provar isso, bastam as estimativas de dois números: a média de erros no trânsito
e a quantidade esperada de multas de um condutor.
Cometemos várias infrações no trânsito toda hora: direção acima da velocidade permitida no local, buzina sem
razão, troca de faixa sem ligar a seta, falar (ou teclar!) no celular, ultrapassagem pela direita, estacionamento em fila
[05] dupla, e muito mais. Vamos ser generosos e estimar em somente dez as infrações diárias de um motorista no Brasil (há
variação regional, mas está para nascer um motorista que respeite todas as nossas regras de trânsito). Se uma pessoa
dirige 200 dias por ano, isso totaliza 2.000 infrações anuais por condutor. Mas, na média, cada condutor brasileiro recebe
duas multas por ano. Isso significa que, a cada mil erros (sendo bem generosos), somente um é punido. Ou seja, a taxa
de punição da “indústria da multa” seria de 0,1%.
[10] Nem todas as multas são pagas. Assim, a real relação entre infrações de trânsito e multas pagas seria ainda menor.
Vocês conhecem alguma empresa que deixe na mesa 99,9% das suas vendas? Imagine um dentista que consertasse
corretamente os dentes de 1 entre 1.000 pacientes. Ou uma fábrica de sapatos na qual 999 de 1.000 fossem defeituosos.
Se existisse indústria da multa, não haveria déficit público no Brasil (exagero, mas não muito). Bastaria colocar
agentes de trânsito em qualquer esquina e sair multando todos os carros e suspendendo carteiras de motorista. Depois,
[15] seria só colocar empresas atrás dos devedores. A inexistência da indústria da multa não significa que nossas regras de
trânsito não possam ser criticadas. Muitas vezes, o Estado usa as multas como medidas punitivas, em vez de educativas.
Regras podem (e devem) ser melhoradas, mas ninguém tem o direito de decidir quais regras seguir. (...) Na verdade, o
clamor contra essa inexistente indústria reúne tudo de pior do brasileiro: egoísmo, irracionalidade, ignorância e falta de
accountability – parte falta de responsabilização individual e parte transferência de responsabilidade para outrem.
[20] A indústria da multa é a desculpa perfeita para uma sociedade doente: “Não é minha culpa, não é meu erro, a multa
nasceu de uma entidade maligna”. O que queremos é simples: que todos respeitem as leis do trânsito, menos nós. Assim,
podemos ver uma fila de carros num afunilamento à direita e irmos na outra pista quase até a junção das pistas, nos
jogando no primeiro espaço vazio que aparecer perto dela. “É só um minutinho”, também dizemos quando estamos
parados em fila dupla, esperando a filha sair do colégio. Os brasileiros conduzem muito mal, num comportamento de
[25] manada que reforça o comportamento ruim dos outros. Talvez seja até impossível respeitar todas as leis do trânsito,
quando ninguém o faz. Mas dirigir mal não é o problema. Colocar a culpa nos outros é que é. Não existe indústria da
multa, o que queremos, como quase sempre, é um atalho para tornar a nossa vida melhor, e que se danem os outros.
(ZEIDAN, Rodrigo. Não existe indústria da multa. Folha de São Paulo, 29/06/2019. Adaptado. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/rodrigo-zeidan/2019/06/nao-existe-industria-da-multa.shtml. Acesso em ago. 2018)
Considere o seguinte fragmento, extraído das linhas 15 e 16 do texto:
A inexistência da indústria da multa não significa que nossas regras de trânsito não possam ser criticadas.
A alternativa cuja reescrita não está de acordo com o sentido original do texto é:
Para responder à questão, leia a crônica “O retorno”, de Manuel Bandeira, que integra a coletânea Flauta de papel, publicada originalmente em 1957.
Meu amigo Sizenando é homem de cor, mas a cor nunca lhe deu nem sombra de recalque. É, aliás, um mestiço eugênico1, alto, robusto, bem formado e quase belo. Tem sido, por todas essas qualidades físicas e mais por uma lábia amorosa verdadeiramente infernal, tem sido amado até o delírio por grandes mulheres de todas as cores e todos os matizes. Sua esposa legítima é branca. Sua amante, também legítima, é outra branca. Com esta vinha ele passando, ultimamente, a maior parte de seus dias, o que acabou levando a mulher legítima a uma expedição ao quartel-general daqueles amores clandestinos. Chegou lá, bateu, a porta entreabriu-se, mas, reconhecido o inimigo, logo se fechou, para dar tempo a que meu amigo se escondesse num armário. Então, aberta de novo e rasgadamente a porta, começou o ajuste de contas entre as duas mulheres. A amante convidou a esposa a debaterem o caso na rua, não só para evitarem o escândalo naquele edifício de apartamentos superlotado, como para salvar Sizenando de uma possível morte por sufocação dentro do armário. Chegadas à porta da rua, tomaram à direita e enfiaram pela primeira transversal.
Tranquilizado pelo silêncio que se seguiu à partida das mulheres, saiu Sizenando de seu esconderijo, despiu o pijama, vestiu a roupa e deixou o apartamento. À porta de entrada do edifício, espiou a um lado e outro, não viu as mulheres, consultou a intuição, para onde terão ido? para a esquerda? para a direita? A intuição respondeu que para a esquerda. Sizenando rumou para a direita e foi cair na boca do lobo. Das lobas, pois deu com as duas mulheres empenhadas num entrevero, as quais, ao verem-no, vieram para ele, tomadas ambas da maior indignação.
Foi então que Sizenando usou de um golpe genial, dizendo-lhes reprovativamente e com grande calma: — Mas vocês, duas brancas, brigando por causa de um preto?! E afastou- -se rápido.
Desfecho: Sizenando, naquela noite, foi pernoitar em casa da mulher legítima, que o recebeu de braços abertos. Passou com ela o dia e a noite seguintes. No terceiro dia, procurou a amante. Duas noites de cão passara ela. Mas quando abriu a porta e viu diante dela o meu eugênico amigo com seu plácido sorriso, abriu-lhe, também, como a outra, os braços de Severina. E os dois se encaminharam para o interior do apartamento: era o movimento de retorno aos quadros constitucionais vigentes.
(Seleta de prosa, 1997.)
1eugênico: indivíduo apto à produção de boa prole.
Em “Sizenando rumou para a direita e foi cair na boca do lobo” (2º parágrafo), a expressão sublinhada pode ser substituída, sem prejuízo para o sentido do texto, por:
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