Questões de Português
Leia os quadrinhos.
Os quadrinhos apresentados abordam uma temática relevante para a sociedade utilizando linguagem coloquial.
Analisando-se as informações verbais e não verbais utilizadas na construção da tirinha, afirma-se corretamente que o humor decorre
Leia a crônica “Caso de justiceiro”, de Carlos Drummond de Andrade, para responder à questão.
Mercadinho é imagem de confusão organizada. Todos comprando tudo ao mesmo tempo em corredores estreitos, carrinhos e pirâmides de coisas se comprimindo, apalpamento, cheiração e análise visual de gêneros pelas madamas, e, a dominar o vozerio, o metralhar contínuo das registradoras. Um olho invisível, múltiplo e implacável, controla os menores movimentos da freguesia, devassa o mistério de bolsas e bolsos, quem sabe se até o pensamento. Parece o caos; contudo nada escapa à fiscalização. Aquela velhinha estrangeira, por exemplo, foi desmascarada.
— A senhora não pagou a dúzia de ovos quebrados.
— Paguei.
Antes que o leitor suponha ter a velhinha quebrado uma dúzia de ovos, explico que eles estão à venda assim mesmo, trincados. Por isso são mais baratos, e muita gente os prefere; casca é embalagem. A senhora ia pagar a dúzia de ovos perfeitos, comprada depois; mas e os quebrados, que ela comprara antes?
A velhinha se zanga e xinga em ótimo português-carioca o rapaz da caixa. O qual lhe responde boas, no mesmo idioma, frisando que gringo nenhum viria lá de sua terra da peste para dar prejuízo no Brasil, que ele estava ali para defender nosso torrão contra piratas da estranja. A mulher, fula de indignação, foi perdendo a voz. Caixeiros acorreram, tomando posição em defesa da pátria ultrajada na pessoa do colega; entre eles, alguns portugueses. A freguesia fez bolo. O mercadinho parou.
Eis que irrompe o tarzã de calção de banho ainda rorejante e berra para o caixa:
— Para com isso, que eu não conheço essa dona mas vê-se pela cara que é distinta.
— Distinta? Roubou cem cruzeiros à casa e insultou a gente feito uma danada.
— Roubou coisa nenhuma, e o que ela disse de você eu não ouvi mas subscrevo. O que você é, é um calhorda e quer fazer média com o patrão à custa de uma pobre mulher.
O outro ia revidar à altura, mas o tarzã não era de cinema, era de verdade, o que aliás não escapou à percepção de nenhum dos presentes. De modo que enquanto uns socorriam a velhinha, que desmaiava, outros passavam a apoiá- -la moralmente, querendo arrebentar aquela joça. O partido nacionalista acoelhou-se. Foram tratando de cerrar as portas, para evitar a repetição de Caxias. Quem estava lá dentro que morresse de calor; enquanto não viessem a radiopatrulha e a ambulância, a questão dos ovos ficava em suspenso.
— Ah, é? — disse o vingador. — Pois eu pago os cem cruzeiros pelos ovos mas você tem de engolir a nota.
Tirou-a do bolso do calção, fez uma bolinha, puxou para baixo, com dedos de ferro, o queixo do caixa, e meteu-lhe o dinheiro na boca.
Assistência deslumbrada, em silêncio admiracional. Não é todos os dias que se vê engolir dinheiro. O caixa começou a mastigar, branco, nauseado, engasgado.
Uma voz veio do setor de ovos:
— Ela não roubou mesmo não! Olha o dinheiro embaixo do pacote!
Outras vozes se altearam: “Engole mais os outros cem!” “Os ovos também!” “Salafra” “Isso!” “Aquilo!”.
A onda era tamanha que o tarzã, instrumento da justiça divina, teve de restabelecer o equilíbrio.
— Espera aí. Este aqui já pagou. Agora vocês é que vão engolir tudo, se maltratarem este rapaz.
(Carlos Drummond de Andrade. Cadeira de balanço, 2020.)
Verifica-se expressão própria da linguagem coloquial no seguinte trecho:
Leia a reportagem, retirada do caderno Ilustrada do jornal Folha de S.Paulo, para responder a questão.
Para o público em geral, ateliês de artistas costumam estar envoltos numa aura de mistério. Visitá-los, afinal, é uma prática limitada a profissionais da arte, como curadores e galeristas.
O livro Espaços de trabalho de artistas latino-americanos, de Beta Germano, satisfaz essa curiosidade. E, recém-lançado pela editora Cobogó, pode servir de inspiração justamente num momento em que todos estão presos em casa.
Para compor a publicação, Germano e o fotógrafo Fran Parente visitaram ateliês de 27 artistas espalhados por oito países. Enquanto ele clicava os espaços, ela, que é jornalista, batia longos papos com seus donos — uma lista que inclui, entre outros, Cildo Meireles, Adriana Varejão e Miguel Rio Branco.
Germano explica que, além da questão regional, outro fator que guiou a feitura dessa lista foi a idade dos artistas. Com 60 anos, em média, muitos deles iniciaram suas carreiras num momento em que a própria ideia do ateliê com móveis cobertos de respingos de tinta era questionada.
Vem daí, aliás, a opção por chamar esses locais de “espaços de trabalho”. Afinal, diz a autora, lugares como aquele do mexicano Carlos Amorales mais parecem escritórios.
Além disso, continua Germano, ao trabalharem nos anos 1970 e 1980, esses artistas viveram as ditaduras da região, experiência que contaminou a obra da maioria deles.
“É muito interessante ver como, mesmo sem internet, as mesmas coisas estavam acontecendo em diversos países”, afirma Germano. “E dividimos uma história de violência muito grande, que começa na colonização, passa pela ditadura, e sobrevive até hoje.”
São temas que também se manifestam nos espaços de trabalho desses artistas. A porta do ateliê da colombiana Delcy Morelos, localizado numa das regiões mais violentas de Bogotá, exibia uma cruz quando Germano foi entrevistá- -la. Um jovem tinha sido assassinado ali dias atrás. “E o ateliê dela é uma paz, uma energia”, diz Germano.
Se o estúdio de Morelos representa um paradoxo também em relação à sua obra, que reflete sobre o sangue derramado pelo narcotráfico no seu país natal, outros ateliês mostram quase uma extensão da produção de seus donos.
Pioneiro da arte postal no país, Paulo Bruscky mantém uma verdadeira barricada de livros e papéis na sua sala, no Recife — o artista imprime todos os e-mails que recebe.
Mesmo que ainda demore para ela e outros voltarem aos ateliês, Germano diz que a ideia é criar um segundo volume do livro. Ela e Parente já foram fotografar outros nove ateliês, de nomes como Anna Maria Maiolino e Artur Barrio.
(Clara Balbi. www.folha.com.br, 26.04.2020. Adaptado.)
Verifica-se o emprego de expressão própria da linguagem coloquial no trecho:
Leia o trecho a seguir para responder à questão.
[...]
— Mãe, quem que leva nossa casa pra outra banda do rio no banhado, quem que leva? Pergunta assim!
A velha fez. Macunaíma pediu pra ela ficar com os olhos fechados e carregou todos os carregos, tudo, pro lugar em que estavam de já-hoje no mondongo imundado. Quando a velha abriu os olhos tudo estava no lugar de dantes, vizinhando com os tejupares de mano Maanape e de mano Jiguê com a linda Iriqui. E todos ficaram roncando de fome outra vez.
Então a velha teve uma raiva malvada. Carregou o herói na cintura e partiu. Atravessou o mato e chegou no capoeirão chamado Cafundó do Judas. Andou légua e meia nele, nem se enxergava mato mais, era um coberto plano apenas movimentado com o pulinho dos cajueiros.
Nem guaxe animava a solidão. A velha botou o curumim no campo onde ele podia crescer mais não e falou:
— Agora vossa mãe vai embora. Tu ficas perdido no coberto e podes crescer mais não.
Andrade, M. Macunaíma. Porto Alegre: L&PM, 2018
Em Macunaíma, Mário de Andrade inova nos padrões linguísticos, nos níveis lexical, morfológico e sintático, ao empregar a linguagem coloquial popular falada como marca de identidade nacional.
No trecho acima, essa brasilidade está presente no(a).
Leia a crônica “Caso de canário”, de Carlos Drummond de Andrade, para responder à questão.
Casara-se havia duas semanas. E por isso, em casa dos sogros, a família resolveu que ele é que daria cabo do canário:
— Você compreende. Nenhum de nós teria coragem de sacrificar o pobrezinho, que nos deu tanta alegria. Todos somos muito ligados a ele, seria uma barbaridade. Você é diferente, ainda não teve tempo de afeiçoar-se ao bichinho. Vai ver que nem reparou nele, durante o noivado.
— Mas eu também tenho coração, ora essa. Como é que vou matar um pássaro só porque o conheço há menos tempo do que vocês? — Porque não tem cura, o médico já disse. Pensa que não tentamos tudo? É para ele não sofrer mais e não aumentar o nosso sofrimento. Seja bom; vá.
O sogro, a sogra apelaram no mesmo tom. Os olhos claros de sua mulher pediram-lhe com doçura:
— Vai, meu bem.
Com repugnância pela obra de misericórdia que ia praticar, ele aproximou-se da gaiola. O canário nem sequer abriu o olho. Jazia a um canto, arrepiado, morto-vivo. É, esse está mesmo na última lona, e dói ver a lenta agonia de um ser tão gracioso, que viveu para cantar.
— Primeiro me tragam um vidro de éter e algodão. Assim ele não sentirá o horror da coisa.
Embebeu de éter a bolinha de algodão, tirou o canário para fora com infinita delicadeza, aconchegou-o na palma da mão esquerda e, olhando para outro lado, aplicou-lhe a bolinha no bico. Sempre sem olhar para a vítima, deu-lhe uma torcida rápida e leve, com dois dedos, no pescoço.
E saiu para a rua, pequenino por dentro, angustiado, achando a condição humana uma droga. As pessoas da casa não quiseram aproximar-se do cadáver. Coube à cozinheira recolher a gaiola, para que sua vista não despertasse saudade e remorso em ninguém. Não havendo jardim para sepultar o corpo, depositou-o na lata de lixo.
Chegou a hora de jantar, mas quem é que tinha fome naquela casa enlutada? O sacrificador, esse, ficara rodando por aí, e seu desejo seria não voltar para casa nem para dentro de si mesmo.
No dia seguinte, pela manhã, a cozinheira foi ajeitar a lata de lixo para o caminhão, e recebeu uma bicada voraz no dedo.
— Ui!
Não é que o canário tinha ressuscitado, perdão, reluzia vivinho da silva, com uma fome danada?
— Ele estava precisando mesmo era de éter — concluiu o estrangulador, que se sentiu ressuscitar, por sua vez.
(70 historinhas, 2016.)
Verifica-se o emprego de expressão própria da linguagem coloquial no seguinte trecho:
Leia o texto a seguir para responder à questão
TEXTO
O Flautim
Um cidadão em Santa Teresa possuía um país secreto que lhe consumia os melhores minutos da
existência.
Gostava de tocar flautim. Nos dias de trabalho, só pela manhã lhe era concedido colocar os dedos
no sóbrio instrumento e soprá-lo. Mas havia os sábados e, mais que estes, os domingos. No quarto
[5] modesto, defronte à janela aberta, ele entoava a sua música, ora imitando composições alheias, ora
deixando que uma nesga de céu o inspirasse e fizesse compartir as sugestões da natureza. Músico de
ouvido, tinha olhos de bom contemplador das obras de Deus e dos homens, e tanto isso era verdade que
o flautim não silenciava. Basta dizer que, no apartamento do lado, havia um advogado que se habituara
a dormir embalado pelo doce refrigério musical, que amortecia os nervos como flauta de um hindu.
[10] O apartamento era pequeno. Solteiro, o cidadão tinha o flautim como outros têm mulher, filho,
quadro abstrato ou coleção de selos. De tinta romântica, sonhava ser enterrado um dia juntamente com
o instrumento, já tendo feito a recomendação cabível às pessoas mais íntimas.
À primeira vista, todos gostavam dele e do instrumento. Uma senhora do quarto pavimento
chamava a atenção dos filhos para a música do flautim, e era de opinião que não havia melhor educação
[15] artística para os garotos, gratuitamente deslumbrados sem precisar sair do edifício. A cozinheira do
apartamento dos fundos desde muito vivia entre dois fogos, pois não sabia o que mais amar no mundo,
se as novelas de rádio ou a música do flautim. Uma solteirona do térreo, encontrando o flautista à saída
do elevador, lhe declarara que sua música possuía um sentido religioso. Tal opinião não era partilhada
pela jovem casadoura do 807, que sublinhara: “Isso é música de quem teve um amor contrariado”. E
[20] todo o edifício contava com sua tarde de sábado e seu inteiro domingo consagrados às alegrias e
pungências do flautim.
Certo domingo, no momento em que o músico procurava traduzir em sonoridade o vento que lhe
entrava pelo quarto, a campainha soou. Foi abrir, e um homem gordo e suado se apresentou: viera ver o
flautim.
[25] Ante a surpresa e tartamudeio de nosso personagem, exibiu um jornal daquela manhã e um
anúncio assinalado. Trêmulo, o flautinista leu: “Por motivo de viagem, vende-se um flautim
completamente novo, marca inglesa, sonoridade magnífica. Preço: 100 cruzeiros. Ver e tratar à...”
Seguiam-se o nome e endereço.
Ele explicou a farsa que havia em tudo aquilo. Não tencionava vender o flautim, decerto fora
[30] alguma brincadeira de colegas.
Cinco minutos depois, era obrigado a dar a mesma explicação a outro senhor, desta vez esgalgo
e irônico.
Voltou ao instrumento. Não decorrera ainda meia hora, e a sua música se interrompia no
momento que ele ousava captar o pipilar de um passarinho no parapeito da janela. Como se fora um rito,
[35] realizou-se a mesma explicação, e as desculpas coincidiram com a decepção dos compradores
interessados naquele negócio da China.
Até a noite, desfilaram pela porta do apartamento inúmeros candidatos àquele flautim inglês,
mágicos de sons, a ser vendido por uma ninharia, o que não representaria uma venda, mas doação
milagrosa.
[40] Exausto, amargurado, o músico compreendera que havia no edifício alguém que não suportava
sua modesta e amorosa arte, e pusera o anúncio infamante. Sentiu-se rodeado de inimigos que queriam
suprimir-lhe o único deleite da vida.
Teve forças, contudo, para reagir ao anônimo desafio, e continuou a dedicar ao instrumento as
suas horas feridas.
[45] Sua música, porém, não festejava mais a alegria solar, a grandeza da paisagem, a doçura da
manhã. De entusiástico, ele se tornou elegíaco. Todos, no edifício, sentiram a transformação do músico.
A solteirona triunfava, pois o sentimento religioso suplantava a sugestão do amor. E a cozinheira,
derramando furtivas lágrimas na macarronada, temperando-a com a sua emoção, exigia que se desligasse
o rádio que transmitia, barulhento, um drama capaz de comover as pedras.
(IVO, Lêdo. O Flautim. In: SALES, Herberto. Antologia de Crônicas. 6 ed. São Paulo: Ediouro, 2005, p.90-91)
Considerando o gênero do texto, analise as proposições a seguir:
I. Consiste em uma breve narrativa.
II. Narra fatos da vida cotidiana.
III. Utiliza linguagem extremamente coloquial.
IV. Pode ter caráter humorístico, crítico, satírico e/ou irônico.
Assinale a alternativa CORRETA.